por que não falamos sobre o assunto? – R7 Esportes


Falta de investimento no futebol feminino e de programas preventivos contribuem para um maior risco de lesões

Lorena ficou de fora da Copa do Mundo por lesão do LCA Reprodução/Instagram @loorenasilva23 – Rafael Ribeiro/CBF

Lesões no LCA (Ligamento Cruzado Anterior) são um problema comum no mundo dos esportes, em especial no futebol. São vários os casos de atletas que tiveram de desfalcar os respectivos clubes em momentos importantes.

Só para citar como exemplo, a goleira Lorena Silva (Kansas City Current), que brilhou na conquista da medalha de prata da seleção brasileira feminina nas Olimpíadas de Paris-2024, ficou de fora da Copa do Mundo Feminina de 2023 justamente por lesionar o ligamento cruzado anterior às vésperas da competição. A goleira Lelê (Corinthians) foi cortada da convocação para Paris após sofrer com a mesma lesão.

O alerta para o assunto é ainda maior quando analisamos os números. Na última Copa do Mundo Feminina, ao menos cinco jogadoras de diferentes seleções viraram desfalques por conta da problema. De acordo com dados de um estudo recente feito pela revista British Journal of Sports Medicine, as mulheres têm de duas até oito vezes mais chances de romper o LCA, quando comparado aos homens.

Mas por que é tão comum?

“A maior prevalência de lesões no Ligamento Cruzado Anterior em mulheres envolvem fatores biológicos, mecânicos e sociais. As mulheres têm uma maior largura do quadril e uma angulação do fêmur diferente, o que pode alterar a mecânica do joelho, logo, elas têm um maior ângulo valgo (joelho ‘em X’), o que pode aumentar o risco de lesões no LCA em algumas atividades e movimentos”, justifica Flávia Magalhães, médica do esporte, que desde 2015 acumula convocações para as seleções brasileiras feminina e masculina de futebol, além de já ter coordenado o departamento médico em competições da CBF.

“Além disso, as mulheres têm padrões de movimento diferentes dos homens, especialmente durante atividades físicas que envolvem pivôs e mudanças rápidas de direção. Essas diferenças podem envolver maior propensão a usar os músculos de forma menos eficaz para controlar os movimentos do joelho, como o quadríceps, com maior deslocamento anterior, sendo ativado mais do que os músculos isquiotibiais, o que coloca maior estresse no LCA”, complementa Flávia.

Onde é a lesão no LCA? Arte/R7

Por que não falar sobre o assunto?

Apesar dos estudos e dos números chocantes, o impacto dessas lesões em mulheres ainda é pouco debatido, o que levanta preocupações sobre a falta de prevenção, conscientização e investimento no futebol feminino.

Christen Press, atualmente no Angel City FC, clube dos EUA, chegou a alertar sobre o assunto em 2023, quando ficou fora dos gramados após se lesionar.

“Nos últimos dois anos, a quantidade de lesões no LCA no futebol feminino foi chocante. Se isso acontecesse no futebol masculino, teríamos visto uma reação de: ‘Como vamos resolver isso e garantir que esses jogadores estarão disponíveis nos momentos mais importantes das respectivas carreiras?’”, provocou Christen na época, em entrevista à ESPN norte-americana.

A ausência de investimento nas categorias de futebol feminino também contribuem não só para a falta de visibilidade sobre o assunto, como para um maior risco de lesões, avalia Flávia Magalhães.

Como lidar com a lesão e a volta aos gramados?

O treinamento preventivo e os exercícios de fortalecimento são estratégias altamente eficazes para reduzir o risco de lesionar o ligamento cruzado anterior. Mas a prevenção vai muito além disso, segundo especialistas. Para isso, até mesmo no ciclo hormonal a preparação precisa ser diferente, já que este período pode influenciar na estabilidade dos ligamentos.

“As intensidades com a carga devem ser prescritas de acordo com a fase menstrual que ela se encontra. Basicamente seria: na fase folicular, trabalhar com mais intensidade, força e potência, pois é uma fase mais segura. Já na fase ovulatória, que é onde o risco de lesão é maior, trabalhar mais controle motor e estabilidade, e tirar um pouquinho desse volume e da intensidade. Na fase lútea, reduzir os impactos e ajustar os volumes conforme o cansaço da atleta. A gente tem que ter essa atenção e controlar o volume de treino”, explica Renato Borges, preparador físico do São José Feminino.

O especialista também ressalta a importância do trabalho preventivo nas lesões.

“Fortalecimento muscular, principalmente da região do core e do quadril, equilibrando a musculatura do isquiotibial e quadríceps, para evitar esse desequilíbrio entre as forças e estabilizar o joelho. O treinamento isométrico para ativação dos músculos mais profundos do joelho e estabilização do quadril. E o treinamento funcional que a gente usa muito para o retorno ao esporte, que faz um bom trabalho entre joelho, quadril e core, e simula os movimentos esportivos.”

Para Renato, além da questão física, o mental é fundamental na recuperação.

“Construir uma confiança entre treinador e atleta para que a atleta confie no processo. É um processo doloroso e longo, as vezes até solitário. E não é apenas se recuperar da lesão, mas ajudar a atleta a reconstruir sua confiança e reforçar sua capacidade de voltar ao jogo em alto nível. Então, vai muito além de uma recuperação física. A atleta precisa de apoio e o preparador físico, o nutricionista, a fisioterapeuta são as pessoas que estão mais próximas dela. Confiar no processo e voltar a fazer aquilo que ela mais gosta, que é jogar futebol”, finaliza o preparador.

Os textos aqui publicados não refletem necessariamente a opinião do Grupo Record.



Veja a matéria completa!

Cookie policy
We use our own and third party cookies to allow us to understand how the site is used and to support our marketing campaigns.

Hot daily news right into your inbox.