Bezerro nasce com ajuda de proteína de peixe e marca avanço na fertilização in vitro bovina no Brasil


O Brasil é o maior produtor de embriões bovinos do mundo e referência no mercado de fertilização in vitro (FIV). Mesmo assim, o setor ainda enfrenta desafios importantes, e um dos principais é o armazenamento dos embriões.

A capacidade de produção é alta, mas o sucesso da gestação depende de vários fatores, como o momento do ciclo reprodutivo da fêmea. Como cada vaca pode receber apenas um ou dois embriões, a maior parte deles precisa ser congelada, o que aumenta o risco de perda celular durante o processo.

Foi nesse contexto que uma pesquisa da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) desenvolveu uma inovação que pode mudar o mercado. O estudo resultou no nascimento de Rafinha, o primeiro bezerro brasileiro gerado por FIV com o uso de uma proteína anticongelante encontrada no peixe linguado-do-ártico, capaz de proteger os embriões durante o congelamento.

O médico veterinário Rafael Silva Júnior, responsável pelo estudo, explica que esse problema é recorrente no processo de congelamento de células. “É como quando a gente esquece uma latinha de cerveja, de refrigerante ou até mesmo uma garrafa de água dentro do freezer do dia para a noite. Ela estoura, porque a água que estava lá dentro aumenta de tamanho e vira um cristal de gelo. Acontece a mesma coisa com a célula.”

Para evitar esse efeito, os pesquisadores usaram a proteína AFP tipo 3, encontrada no linguado-do-ártico. “Nos anos 1960, pesquisadores canadenses descobriram que esses peixes sobreviviam mesmo com a água congelada. Eles tinham uma proteína no plasma sanguíneo que se ligava às moléculas de água e impedia a cristalização”, explica Rafael.

Assim, a proteína foi utilizada na pesquisa em embriões bovinos, adicionando a AFP 3 ao meio de congelamento como uma solução crioprotetora, e o resultado foi uma taxa de sobrevivência muito alta. Mas ainda restava uma pergunta: será que o uso da solução interferiria na implantação do embrião no útero da fêmea e no desenvolvimento do feto na gestação?

Nascimento do Rafinha

A resposta para essa questão veio quando um embrião foi implantado em uma vaca no período fértil, e após 30 dias foi confirmada a gestação. Nove meses depois, nasceu o bezerro Rafinha, concluindo com êxito a pesquisa. “A gente ainda tinha receio por causa da raça [nelore] e do tamanho do touro, mas o nascimento foi tranquilo e o bezerro nasceu sem nenhum problema”, relata o pesquisador.

bezerro Rafinha
Foto: Rafael Silva Júnior

Avanço pode beneficiar pequenos produtores

Segundo Rafael, o estudo foi desenvolvido pensando nas necessidades da pecuária nacional. O aumento da taxa de sobrevivência dos embriões pode impulsionar ainda mais o mercado da FIV no Brasil, reduzindo custos e democratizando o acesso à tecnologia.

“Com a FIV, é possível pegar o melhor touro e a melhor vaca e gerar dezenas de embriões de alta qualidade genética. Assim, mesmo pequenos pecuaristas podem acelerar o melhoramento genético do rebanho”, afirma.

Além disso, a redução nas perdas durante o congelamento pode tornar o processo mais barato, ampliando o uso da técnica em propriedades menores.

“Já conseguimos taxas de até 90% de embriões sobrevivendo ao descongelamento. Isso tem impacto direto no custo, tornando a tecnologia mais acessível e ampliando o alcance da FIV”, afirma o médico-veterinário.

Tecnologia próxima da realidade do campo

De acordo com o pesquisador, a técnica é simples e rápida, exigindo apenas o resfriamento dos embriões em nitrogênio líquido. Os principais desafios, por enquanto, são o acesso à proteína anticongelante, ainda indisponível comercialmente, e o domínio do processo de aquecimento e transferência dos embriões.

Mesmo assim, a perspectiva é promissora. A aplicação da proteína do linguado-do-ártico representa um salto na biotecnologia animal e reforça o papel do Brasil como referência mundial em reprodução bovina.

*Sob supervisão de Hildeberto Junior



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