A história recente do Oscar é recheada de acidentes e momentos inesperados. Só nos últimos 12 anos, a principal premiação de Hollywood testemunhou no palco do Dolby Theater cenas malucas como a queda de Jennifer Lawrence nas escadarias do palco, o anúncio errado de “La La Land” como melhor filme e até o tapa de Will Smith no apresentador Chris Rock.
Todas essas situações são insólitas, mas também fazem sentido no histórico do evento. Depois de quase cem anos, a cerimônia organizada pela Academia de Artes e Ciências Cinematográficas já viveu de tudo, e dá para dizer que o prêmio está sempre atrás destes momentos estranhos. O público, pelo menos, espera ansioso por eles.
Desde 1953, quando passou a ser televisionada ao vivo de Los Angeles, a premiação teve momentos insólitos com seus vencedores e os seus apresentadores. Ninguém está incólume de um acontecimento não previsto na agenda do evento, afinal, e as formas como se resolvem as situações definem as edições do Oscar na memória das pessoas.
Relembre alguns dos casos mais esquisitos da premiação. A 97ª edição do Oscar acontece neste domingo, a partir das 21h —saiba onde ver.
Largados e pelados
O incidente mais famoso é a invasão de um homem pelado no palco da edição de 1974. Na ocasião, o ator britânico e apresentador da noite David Niven introduzia a atriz Elizabeth Taylor para revelar o vencedor na categoria de melhor filme —”Golpe de Mestre”, de George Roy Hill.
Quando Niven estava prestes a chamar Taylor ao palco, porém, o ativista Robert Opel cruzou o palco da premiação, fazendo um sinal da paz enquanto passava pelas costas do apresentador. O ator primeiro olhou sorrindo para a cena e ainda foi pego com o olhar atônito pela câmera antes que a transmissão mudasse de ângulo, permitindo que a produção agisse.
A cena ficou ainda melhor que o planejado por Opel porque Niven, na hora, falava aos presentes sobre como o mundo estava um caos e como o cinema agia como uma válvula de escape ao momento.
Opel era fotógrafo da revista “The Advocate”, dedicada ao público LGBTQIA+, e vinha fazendo participações nudistas em eventos como protestos contra o conformismo da sociedade americana. Ele repetiria o ato naquele mesmo ano em uma reunião do conselho da cidade de Los Angeles.
Apesar do choque da época, a Academia já tentou repetir a cena algumas vezes. Só nos últimos dez anos, a situação se repetiu duas ocasiões. Em 2015, o ator e apresentador Neil Patrick Harris replicou uma cena do filme “Birdman” ao entrar no palco vestindo apenas uma cueca.
Já no ano passado a premiação homenageou os 50 anos da invasão do peladão colocando o ator John Cena para apresentar nu a estatueta de figurino.
O de hoje está pago
A edição de 1992 tem discurso de agradecimento dos mais intrigantes graças a Jack Palance. O ator, célebre na Hollywood dos anos 1950, venceu naquela noite a sua primeira e única estatueta da carreira pela comédia “Amigos, Sempre Amigos”, de Ron Underwood.
Palance subiu ao palco para receber o prêmio e, depois de fazer uma piada rápida com Billy Cristal, surpreendeu a todos ao se deslocar para a direita do palco e fazer flexões com um braço só, do alto dos seus 73 anos.
Palance decidiu fazer o exercício após falar sobre como vinha sendo descartado para papéis por ser considerado velho demais para eles. “Eles esquecem de pedir a você para ir lá fora e fazer todas essas coisas”, disse.
O ator ainda se lembrou de um produtor que, em seu primeiro filme, em 1949, disse depois de duas semanas de gravações que ele venceria um Oscar. “Quarenta e dois anos depois, o desgraçado estava certo. Como ele sabia?”, afirmou.
Bateu, cenourinha
Alguns momentos tocantes do Oscar podem ter uma história de bastidores peculiar por trás. Bom exemplo disso é a vitória de Steven Soderbergh na estatueta de direção em 2001. Na época, a cena foi vista como um triunfo do cinema independente.
O diretor levou o prêmio pelo thriller “Traffic”, superando nomes como o de Ridley Scott, Stephen Daldry e até a si mesmo —ele dobrou a indicação na categoria com seu trabalho em “Erin Brockovich”.
O discurso de Soderbergh também foi marcante, com o cineasta dedicando o Oscar a todos os artistas, e a sua brevidade —ele demorou apenas 90 segundos no palco— virou anos depois uma referência para a Academia nas orientações aos novos e futuros vencedores. Só que havia um problema nessa equação —Soderbergh estava bêbado quando subiu ao palco do Dolby Theater.
O diretor só foi falar do assunto em 2019, durante uma entrevista ao site Indiewire e porque perguntaram do que ele achava de ser uma referência em discursos do Oscar. Segundo Soderbergh, ele bebeu todas por julgar que seria impossível a sua vitória, exatamente diante da dupla indicação e da vitória de Ang Lee no prêmio do sindicato dos diretores.
“Fui sob a impressão de que não seria eu, porque era isso que estava se desenhando”, disse o cineasta na conversa. “Eu visitava o open bar e estava tomando doses duplas de vodka com cranberry a cada novo comercial da transmissão. Eu estava ébrio, e porque sabia que não seria eu, também não preparei nada.”
Soderbergh cita na entrevista que a sua demora para responder ao anúncio entrega o seu estado alcoolizado, mas o vídeo também mostra o diretor dando passos confusos mais próximo do palco.
Cara, cadê o meu sapato?
Outro clássico dos bastidores do Oscar, a edição de 1986 contou com um pequeno atraso de Geraldine Page para chegar ao palco. Anunciada pelo ator F. Murray Abraham como vencedora da estatueta de melhor atriz, a veterana do teatro britânico demorou alguns bons segundos para levantar de seu assento e caminhar até o pódio.
O que aconteceu foi outro caso de alguém não acreditando tanto assim no próprio taco. Page estava tão conformada com a derrota que assistia ao evento descalça e, na hora do anúncio, não sabia onde tinha enfiado os sapatos.
A insegurança da atriz tinha um fundo de verdade. Page estava indicada naquela noite por “O Regresso para Bountiful”, uma produção independente que não tinha a mesma verba dos estúdios para fazer uma grande campanha com os votantes da Academia. Sua vitória foi uma surpresa na noite, superando nomes mais encorpados na corrida como o da veterana Anne Bancroft e o de Meryl Streep, protagonista do grande vencedor daquele ano, “Entre Dois Amores”.
Expresso dourado
Os discursos de agradecimento do Oscar no geral demoram de dois a três minutos, graças aos esforços da produção, mas a história tem seus superlativos.
O discurso mais longo da história, por exemplo, antecede o início da transmissão na televisão. Em 1942, Greer Garson falou aos convidados por sete minutos depois de vencer a estatueta de melhor atriz por “Rosa da Esperança”. O agradecimento é tão extenso e tão antigo que hoje em dia há apenas trechos da fala da artista disponíveis —nem mesmo a Academia tem a cena completa preservada.
Por outro lado, Joe Pesci pregou uma peça na edição de 1991. Quando venceu o Oscar de melhor ator coadjuvante por “Os Bons Companheiros”, ele permaneceu no palco por meros seis segundos. O discurso? “Foi um privilégio. Obrigado.”
As reportagens da época afirmam que o ator falou tão pouco porque ele genuinamente não acreditava na possibilidade de vitória. Enfrentava nomes como Al Pacino, por “Dick Tracy”, e “Graham Greene”, ator do grande campeão da noite, “Dança com Lobos”.
O artista também estava em sua segunda indicação ao prêmio, depois de ser lembrado pelos votantes dez anos antes por “Touro Indomável” na categoria de ator coadjuvante. Depois de “Os Bons Companheiros”, Joe Pesci só voltaria à disputa do Oscar, de novo no prêmio de apoio, depois de 29 anos, por seu trabalho no filme “O Irlandês” —três longas dirigidos por Martin Scorsese.
Pacote danificado
O ato de rasgar um envelope e anunciar um vencedor é repetido há quase cem anos no Oscar, pelo menos 20 vezes a cada nova cerimônia, e a princípio parece impossível achar uma forma diferente de revelar o vencedor da estatueta. Mas sempre rolam acidentes terríveis, bons improvisos e sacadas legais.
Em 1964, por exemplo, a atriz Rita Hayworth errou o nome do inglês Tony Richardson, chamando-o de “Tony Richards” ao anunciá-lo como vencedor do prêmio de direção por “As Aventuras de Tom Jones”. A situação, como a troca dos envelopes do Oscar de “Moonlight”, foi erro da organização, que perdeu um envelope especial com letras maiores no cartão —a atriz tinha miopia.
Já em 2004 o diretor Steven Spielberg fez uma emenda bonitinha ao clássico “e o Oscar vai para”. “É uma limpeza geral”, disse o cineasta antes de confirmar que “O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei” vencera a estatueta de melhor filme e levara em todas as categorias ao qual estava indicado.
Mas uma das cenas mais legais envolvendo o envelope enigmático aconteceu no ano anterior, em 2003. No palco para anunciar o vencedor de melhor filme daquela noite, os atores Kirk Douglas e Michael Douglas brincaram com a expectativa ao rasgar ao meio o cartão. Depois de cortar em dois o envelope, Kirk, o pai, entrega uma das metades a Michael, o filho, e os dois juntam revelam ao mundo que o musical “Chicago” era o campeão daquele ano.
O carinho do torcedor
De volta aos tempos atuais, o último grande incidente do Oscar foi o tapa de Will Smith no comediante Chris Rock. Há três anos, o ator subiu no palco para agredir o apresentador por conta de uma piada envolvendo sua mulher, Jada Pinkett Smith.
Na transmissão e ao vivo, a cena passou como parte do evento, com o público rindo do tapa. O horror da situação só transpareceu aos presentes quando Smith grita duas vezes para Rock: “Tire o nome da minha mulher de sua boca”.
Na época, Smith concorria ao prêmio de melhor ator pelo filme “King Richard: Treinando Campeãs”, uma indicação que se tornaria uma vitória no fim da noite. De volta ao palco depois de uma hora do incidente, o ator pediu desculpas à Academia e aos indicados pela agressão, afirmando que gostaria de ser um recipiente de amor naquele momento. Ele até citou o colega Denzel Washington, que foi flagrado no evento conversando e acalmando o artista após o tapa.
A Academia baniu Will Smith da cerimônia por dez anos, confirmando que o ator não poderá comparecer ao evento no período mesmo se for indicado. O ator também renunciou voluntariamente ao seu status de membro do grupo.